I. O Conselho de Ministros, reunido hoje na Presidência do
Conselho de Ministros, aprovou o seguinte diploma:
Proposta de Lei que cria o cartão de cidadão e rege a sua
emissão e utilização
Esta Proposta de Lei, a submeter à Assembleia da República,
insere-se no programa de modernização do Estado e visa dar resposta
à necessidade inadiável de introduzir na Administração Pública e na
sociedade em geral um novo instrumento de simplificação.
O cartão de cidadão substituirá o bilhete de identidade e os
cartões de identificação fiscal, de eleitor, de utente dos serviços
de saúde e de beneficiário da Segurança Social. Cada cartão de
cidadão permitirá a identificação presencial e a autenticação
electrónica.
O cartão de Cidadão respeita a proibição constitucional de
número único e de cruzamento de dados.
Para além dos elementos de identificação, o Cartão de Cidadão
permite disponibilizar ao respectivo titular alguma memória para
armazenamento, se assim o desejar, de informações pessoais
relativas ao grupo sanguíneo, a indicações de alergias ou a
contactos de emergência.
Igualmente, consagra-se a oferta da funcionalidade de
autenticação electrónica e de assinatura electrónica qualificada,
neste caso opcional, num documento que é de uso generalizado e está
conforme aos mais exigentes parâmetros de identificação segura.
Trata-se, assim, de um documento electrónico que será emitido em
observância de novos requisitos de protecção contra a fraude,
utilizando dispositivos avançados que garantem um elevado nível de
integridade, autenticidade e confidencialidade, à semelhança do
reforço de segurança já concretizado no regime do novo modelo de
passaporte electrónico.
No que toca à utilização das funcionalidades do cartão, a regra
é a do controlo exclusivo do próprio titular sobre o acesso à
informação armazenada no circuito integrado (chip) e relativa aos
seus elementos de identificação.
Quanto à cobertura do território nacional, consagra-se uma
cobertura progressiva, não se impondo qualquer prazo para requerer
a substituição do bilhete de identidade, evitando-se deste modo os
riscos de uma afluência simultânea muito elevada aos serviços de
recepção e de emissão do cartão de cidadão.
À medida que estes serviços forem sendo instalados, os cidadãos
que a eles se desloquem por necessitarem de pedir a emissão ou a
renovação do bilhete de identidade serão contemplados com o novo
cartão de cidadão. A Proposta de Lei não especifica quais as zonas
do País onde vão funcionar, logo de início, os serviços de recepção
de pedidos de cartão de cidadão, remetendo esta questão para
regulamentação a aprovar após a entrada em vigor da lei.
Por último comete-se à Direcção-Geral dos Registos e do
Notariado a gestão centralizada dos procedimentos relativos à
emissão e demais operações do cartão de cidadão, cujos pormenores
de regulamentação são remetidos para portaria.
II. O Conselho de Ministros aprovou, também, um conjunto de
iniciativas no âmbito da Justiça:
1. Resolução do Conselho de Ministros que aprova orientações
para a apresentação de iniciativas legislativas com impacto sobre o
sistema judicial, a propor à Assembleia da República.
Esta Resolução aprova orientações e procede à calendarização de
um vasto conjunto de iniciativas legislativas em que o Governo tem
vindo a trabalhar e que pretende apresentar à Assembleia da
República, tendo em vista aprofundar a eficiência do sistema
judiciário e os direitos fundamentais dos cidadãos e das empresas
no acesso à Justiça, estabelecendo a calendarização da sua
concretização.
Assim, para além das Proposta de Lei hoje aprovadas, na
generalidade ou na sua versão final, relativas ao Código Penal, ao
Código de Processo Penal, à criação de um sistema de mediação penal
e ao regime de recursos em processo civil, a Resolução prevê,
também, a aprovação, no prazo de 180 dias, de uma Proposta de Lei
que viabilize a reforma do sistema de execução das penas e medidas
privativas da liberdade.
Também está prevista a aprovação, dentro do mesmo prazo, de uma
Proposta de Lei que proceda à revisão do mapa judiciário, no
seguinte sentido:
a) Criação de novas circunscrições judiciais a partir das NUTs
II e III;
b) Reformulação do modelo de gestão do sistema judicial em
função da adopção de novas circunscrições, nomeadamente quanto ao
reforço das funções do juiz presidente, à gestão de recursos
humanos e à criação de uma gestão profissionalizada dos meios
disponíveis.
No mesmo modo, prevê-se a aprovação, dentro deste prazo, de uma
Proposta de Lei que viabilize alterações ao regime da acção
executiva, promovendo a sua celeridade e eficiência, designadamente
o acesso de licenciados em direito, nomeadamente de advogados, ao
exercício de funções de agente de execução.
A Resolução estabelece, ainda, a aprovação, num prazo de 120
dias, de uma Proposta de Lei de revisão do modelo de acesso à
magistratura, adoptando-se um figurino de formação que reflicta as
diferenças entre o exercício das magistraturas judicial e do
Ministério Público e compreenda áreas de actividade social onde os
litígios surgem com mais frequência, bem como a existência de
módulos de formação comuns com outras profissões jurídicas.
Também, neste prazo de 120 dias, está prevista a aprovação de
uma Proposta de Lei sobre o acesso e formação de magistrados para
os Tribunais Administrativos e Fiscais, com vista à concretização
do plano de acção do Governo para a melhoria da justiça tributária.
Dentro do mesmo prazo, será aprovada uma Proposta de Lei de revisão
dos Estatutos dos Magistrados Judiciais e do Ministério Público,
incluindo a aproximação aos princípios gerais em matéria de
aposentação e jubilação, a adopção de provas públicas para o acesso
aos tribunais superiores e a criação de uma quota de juízes
conselheiros de preenchimento obrigatório por juristas de mérito
não pertencentes às magistraturas.
Ainda no prazo de 120 dias, prevê-se a aprovação de uma Proposta
de Lei que proceda às alterações necessárias ao aprofundamento da
autonomia do Conselho Superior da Magistratura.
Por último, a Resolução estabelece a aprovação, no prazo de 120
dias, de uma Proposta de Lei que proceda ao aperfeiçoamento do
regime jurídico do acesso ao direito e aos tribunais, mediante o
reforço efectivo deste direito fundamental, a criação de um sistema
de apoio judiciário mais racional e que valorize a defesa e o
patrocínio oficiosos e o alargamento do âmbito subjectivo e da
cobertura territorial da consulta jurídica. Finalmente, o Governo
decidiu aprovar, no prazo de 90 dias, uma Proposta de Lei de
simplificação e modernização do regime jurídico das custas
processuais.
2. Proposta de Lei que autoriza o Governo a alterar o regime dos
recursos em processo civil, o regime dos conflitos de competência e
a competência dos julgados de paz
Esta Proposta de Lei de autorização legislativa, hoje aprovada
na sua versão final, visa a criação de condições para melhorar e
qualificar a resposta judicial em duas áreas essenciais: o regime
dos recursos em processo civil e o regime dos conflitos de
competência.
No domínio dos recursos em processo civil, a Proposta de Lei
visa iniciar uma reforma norteada por três objectivos
fundamentais:
a) Simplificação do regime de recursos, quer nas suas espécies,
que passam a contar apenas com dois recursos ordinários (a apelação
e a revista, eliminando‑se o agravo) e dois recursos
extraordinários (a revisão e o recurso extraordinário de
uniformização de jurisprudência, eliminando‑se a oposição de
terceiro), quer no seu processamento, designadamente pela adopção
de um regime monista de recursos ordinários e extraordinários; na
opção de fazer coincidir o momento da interposição de recurso com a
apresentação de alegações e o despacho de admissão com aquele que
ordena a respectiva subida; na revisão do regime de reclamação do
despacho do tribunal recorrido que não admite o recurso,
estabelecendo que o seu julgamento compete ao relator; ou na
alteração introduzida no regime de vistos aos juízes adjuntos, que
passam a realizar‑se em simultâneo com a entrega da cópia do
projecto de acórdão, processando‑se simultaneamente, por meios
electrónicos.
b) Maior celeridade processual e economia processuais, não
apenas na fase de julgamento no tribunal superior, por força da
alteração do regime de vistos, como naquela que se processa perante
o tribunal recorrido, quer pela assinalada alteração do regime de
interposição, admissão e subida, quer pela revisão do regime de
arguição dos vícios e da reforma da sentença, a qual, cabendo
recurso da decisão, é sempre feita na respectiva alegação. Por
outro lado, o projectado regime geral de impugnação das decisões
que não põem termo ao processo, que passam a só poder ser
impugnadas no recurso que venha a ser interposto da decisão final,
além de reduzirem o número de recursos, trarão benefícios evidentes
à própria tramitação dos processos em 1.ª instância.
c) Racionalização do acesso ao Supremo Tribunal de Justiça,
acentuando‑se as suas funções de orientação e uniformização da
jurisprudência, nomeadamente através das seguintes medidas: (i)
revisão da alçada da Relação para 30.000 euros, que é
acompanhada de uma alteração das regras sobre o valor da causa, que
passa a ser sempre fixado pelo juiz; previsão da inadmissibilidade
da revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido
e ainda que por diferente fundamento, a decisão da 1.ª instância,
salvo quando esteja em causa uma questão cuja apreciação é
claramente necessária para uma melhor aplicação do direito; (ii) a
consagração da inadmissibilidade da revista sempre que a orientação
perfilhada no acórdão da Relação estiver de acordo com a
jurisprudência uniformizada do Supremo Tribunal de Justiça, no
domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de
direito; (iii) consagração do direito de recurso, independentemente
da alçada e da sucumbência, das decisões proferidas contra
jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal de Justiça; (iv) a
obrigatoriedade que passa a impender sobre o relator e os adjuntos
de suscitar o julgamento ampliado da revista sempre que verifiquem
a possibilidade de vencimento de uma solução jurídica que contrarie
jurisprudência uniformizada do Supremo Tribunal de Justiça; e,
finalmente, (v) a introdução de um recurso extraordinário de
uniformização de jurisprudência para o pleno das secções cíveis do
Supremo quando este tribunal, em secção, proferir acórdão que
esteja em contradição com outro anteriormente proferido, no domínio
da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de
direito.
Em matéria de conflitos de competência, o diploma visa,
igualmente, imprimir maior simplicidade e celeridade num regime que
tende a consubstanciar-se na eternização da discussão sobre uma
matéria que é prévia à discussão material sobre a causa. Neste
sentido, propõe-se que: (i) Os conflitos de competência passam a
ser resolvidos por um juiz singular, num único grau, tanto no
Supremo Tribunal de Justiça como nos tribunais da Relação; (ii) O
tribunal que se aperceba do conflito passa a ter o dever de o
suscitar oficiosamente junto do tribunal competente para decidir; e
(iii) O processo de resolução dos conflitos de competência passa a
ter carácter urgente.
3. Proposta de Lei que procede à vigésima primeira alteração ao
Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de
Setembro.
Esta Proposta de Lei, hoje aprovada em versão final para
submeter à aprovação da Assembleia da República, visa alterar a
Parte Geral e da Parte Especial do Código Penal, com base nos
trabalhos desenvolvidos no âmbito da Unidade de Missão para a
Reforma Penal.
Esta revisão procura fortalecer a defesa dos bens jurídicos, sem
nunca esquecer que o direito penal constitui a ultima ratio da
política criminal do Estado, abrangendo a alteração de 110 artigos
e o aditamento de 14 artigos ao Código em vigor.
Assim, de entre as suas principais orientações, destacam-se:
a) A consagração da responsabilidade penal das pessoas
colectivas, tida como indispensável para prevenir actividades
especialmente danosas;
b) A diversificação das sanções não privativas da liberdade,
para adequar as penas aos crimes, promover a reintegração social
dos condenados e evitar a reincidência;
c) A resposta mais eficaz a fenómenos criminais graves, como o
tráfico de pessoas, o incêndio florestal, os crimes ambientais e as
falsificações;
d) O reforço da tutela de pessoas particularmente indefesas,
como as crianças, os menores e as vítimas de violência doméstica,
maus-tratos ou discriminação;
e) A tipificação de novos crimes contra a liberdade pessoal e
sexual e a previsão de novas circunstâncias agravantes nos crimes
contra a vida e a integridade física;
f) A efectiva reparação do prejuízo causado à vítima nos crimes
contra o património; a distinção de níveis de responsabilidade pela
violação de segredos, tendo em conta a qualidade do agente e o
resultado produzido.
Assim, na Parte Geral, salientam-se as alterações à aplicação da
lei no tempo e no espaço, à responsabilidade das pessoas
colectivas, ao concurso de crimes e ao crime continuado, ao
consentimento do ofendido, às penas substitutivas e à suspensão da
pena de prisão, à liberdade condicional, ao direito de queixa e à
prescrição do procedimento criminal.
Na parte Especial as modificações referem-se a vários tipos de
crime, de que se destacam: homicídio qualificado, ofensa à
integridade física grave, violência doméstica, maus-tratos,
violação de regras de segurança, ameaça, tráfico de pessoas,
coacção sexual, violação, abuso sexual, lenocínio, prostituição de
menores, pornografia de menores, violação de domicílio ou
perturbação da vida privada, furto qualificado, burla qualificada e
outros tipos de burla, abuso de cartão de garantia ou de crédito,
discriminação racial, religiosa ou sexual, violação da obrigação de
alimentos, falsificação de documentos, incêndios e incêndio
florestal, danos contra a natureza, poluição, utilização de menor
na mendicidade, associação criminosa e violação de segredo por
funcionário.
4. Proposta de Lei que procede à décima quinta alteração ao
Código Processo Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 78/87, de 17
de Fevereiro.
Esta Proposta de Lei, aprovada na generalidade, para posterior
apresentação à Assembleia da República, visa alterar o Código de
Processo Penal em 189 artigos, tendo por base os trabalhos
desenvolvidos no âmbito da Unidade de Missão para a Reforma
Penal.
Esta revisão procura aprofundar, no desenvolvimento do próprio
Direito Constitucional e no âmbito dos procedimentos, gerais e
especiais, de aplicação da lei penal, os direitos, liberdades e
garantias fundamentais dos cidadãos - arguidos ou vítimas, reais ou
potenciais, de crimes.
As alterações procuram conciliar a protecção da vítima e o
desígnio de eficácia e celeridade processual com as garantias de
defesa próprias do Estado de direito democrático.
Assim, prevêem-se modificações com especial repercussão no
aspecto da celeridade processual: (i) São eliminados os recursos
interlocutórios inúteis e é simplificada a resolução dos conflitos
de competência jurisdicional e os incidentes de recusa; (ii) É
alargado o âmbito de aplicação da forma sumária de processo, que
passa a abranger os casos de flagrante delito por crime punível com
pena de prisão até 5 anos, extingue-se a fase instrutória nas forma
abreviada de processo e acaba-se com a transcrição generalizada das
audiências.
A Proposta de Lei altera mais de um terço do articulado total do
Código, abrangendo um vasto conjunto de matérias que inclui os
sujeitos, os actos, os meios de prova, as medidas de coacção, o
inquérito, a instrução, o julgamento, os processos especiais, os
recursos e a execução das penas.
Entre outras, merecem destaque as seguintes alterações:
a) Os conflitos de competências passam a ser decididos de forma
mais célere pelos presidentes do STJ, das Relações e das
respectivas secções criminais;
b) Não há lugar à instauração de inquérito perante notícias de
crime manifestamente infundadas;
c) A constituição de arguido, dada a estigmatização social e a
eventual limitação de direitos que envolve, passa a estar sujeita,
quando efectuada por órgão de polícia criminal, a validação por
magistrado;
d) O arguido é obrigatoriamente informado dos factos imputados e
dos meios de prova cuja revelação não puser em causa a
investigação, a descoberta da verdade ou direitos fundamentais de
outras pessoas, antes de ser interrogado;
e) O interrogatório do arguido tem uma duração máxima de quatro
horas, só podendo ser retomado, por período idêntico, após um
intervalo mínimo de uma hora;
f) O segredo de justiça é restringido, passando os sujeitos a
aceder ao processo sempre que não haja prejuízo para a investigação
ou para direitos fundamentais;
g) Para proteger as testemunhas e, em especial, os membros de
serviços e forças de segurança, permite-se que elas indiquem ao
tribunal, para efeitos de notificação, o local de trabalho ou outro
domicílio à sua escolha;
h) Permite-se que a testemunha se faça sempre acompanhar de
advogado, que a informa dos direitos que lhe assistem sem intervir
na inquirição;
i) Na quebra de segredo profissional, justificada por um
interesse preponderante, explicita-se que esse interesse poderá
resultar da imprescindibilidade do depoimento, da gravidade do
crime ou da necessidade de protecção de bens jurídicos;
j) Só se admite o reconhecimento por fotografia, como meio de
investigação, quando for seguido de reconhecimento presencial;
l) Só são permitidas perícias sobre características físicas ou
psíquicas de pessoas mediante despacho de juiz, que pondera o
direito à integridade e à reserva da intimidade do visado;
m) Em consonância com a revisão constitucional de 2001,
permite-se a realização de buscas domiciliárias nocturnas, nos
casos de terrorismo, criminalidade especialmente violenta ou
altamente organizada, consentimento do visado e flagrante delito
por prática de crime punível com pena de prisão superior a três
anos;
n) Esclarece-se que só os suspeitos, arguidos, intermediários e
vítimas (neste caso, mediante consentimento efectivo ou presumido)
podem ser objecto de escutas e que o auto e os suportes das escutas
são apresentados pelo órgão de polícia criminal ao Ministério
Público de quinze em quinze dias, para posterior controlo pelo juiz
no prazo de quarenta e oito horas;
o) Os prazos de prisão preventiva são reduzidos em termos
equilibrados, tendo em conta o carácter excepcional desta mediada e
sem prejudicar os seus fins cautelares; porém, no caso de o arguido
já ter sido condenado em duas instâncias, esse prazo eleva-se para
metade da pena em que tiver sido condenado;
p) A prisão preventiva passa a ser aplicável a crimes dolosos
puníveis com pena de prisão superior a cinco anos e, ainda, em
situações de terrorismo, criminalidade violenta ou altamente
organizada;
q) Atribui-se o direito de ser indemnizado a quem tiver sofrido
privação da liberdade e vier a ser absolvido por estar
comprovadamente inocente;
r) Impõe-se ao tribunal o dever de informar o ofendido da data
em que cesse a prisão preventiva, o cumprimento de pena ou se tiver
verificado a fuga do detido, quando esta possa causar perigo;
s) Estabelece-se que a detenção fora de flagrante delito só pode
ser efectuada quando houver fundadas razões para crer que o visado
se não apresentaria voluntariamente perante a autoridade;
t) Para proteger testemunhas e vítimas prescreve-se o regime de
declarações para memória futura no inquérito, no caso de crimes
contra a liberdade e autodeterminação sexual de menores e tráfico
de pessoas;
u) Nos crimes particulares, determina-se o arquivamento quando o
Ministério Público não acompanhar a acusação do assistente, cabendo
a este requerer a instrução;
v) A audiência passa a ser sempre documentada não se admitindo
que os sujeitos prescindam de tal documentação;
x) Prevê-se a reabertura da audiência, a requerimento do
condenado, quando após o trânsito em julgado tiver entrado em vigor
uma lei penal de conteúdo concretamente mais favorável;
z) Para reforçar a celeridade processual, alarga-se o processo
sumário aos casos de detenção em flagrante delito por crime punível
com prisão não superior a cinco anos;
aa) Com o mesmo objectivo, concretiza-se o conceito de provas
simples e evidentes, em que se pode aplicar o processo abreviado,
esclarecendo-se que elas existem em casos de flagrante delito,
provas documentais ou testemunhas presenciais com versão uniforme
dos factos;
bb) Para dignificar o recurso de segundo grau perante o STJ,
determina-se que ele só é admissível quando a Relação tiver
condenado o arguido em penas concretas de prisão superiores a cinco
ou oito anos de prisão, conforme os casos;
cc) Para evitar actos processuais supérfluos, prevê-se que só há
audiência, no tribunal de recurso, quando o recorrente requeira a
sua realização e indique os pontos que deseja ver debatidos;
dd) Também quanto aos recursos e com o objectivo de
simplificação, eliminam-se a alegações escritas, que constituem
quase sempre uma repetição das motivações;
ee) Suprime-se a transcrição da audiência de julgamento,
passando o recorrente a referir as passagens concretas das
gravações que justificam, a seu ver, uma decisão diversa;
ff) Nos tribunais de recurso passará a caber ao relator rejeitar
recursos manifestamente infundados e decidir questões simples, já
apreciadas antes de modo uniforme e reiterado, cabendo recurso, dos
seus despachos, para a conferência;
gg) Nos tribunais de recurso, a conferência passa a ser
constituída apenas por três juízes, cabendo-lhe julgar os recursos
sempre que não tenha sido requerida audiência;
hh) Prevê-se o recurso extraordinário de revisão de sentença
quando se descobrir que serviram de fundamento à condenação provas
proibidas, quando tiver sido declarada a inconstitucionalidade de
norma de conteúdo menos favorável ao arguido ou quando exista
sentença de instância internacional inconciliável com a
condenação;
ii) Passa a admitir-se segundo pedido de revisão da sentença
quando o recorrente apresente novo fundamento, em consonância com a
jurisprudência do Tribunal Constitucional.
5. Proposta de Lei que cria um regime de mediação em processo
penal, em execução do artigo 10.º da Decisão-Quadro n.º
2001/220/JAI do Conselho de 15 de Março de 2001, relativa ao
estatuto da vítima em processo penal.
Esta Proposta de Lei, a submeter à Assembleia da República, visa
a introdução da possibilidade de mediação em processo penal,
criando um programa experimental que terá a duração de dois anos e
decorrerá num número limitado de comarcas e, simultaneamente, dar
cumprimento a uma decisão-quadro do Conselho, relativa ao estatuto
da vítima em Processo Penal, e a uma recomendação do Conselho da
Europa.
Trata-se de um processo informal e flexível, de carácter
voluntário e confidencial, conduzido por um terceiro imparcial - o
mediador -, que promove a aproximação entre o arguido e o ofendido
e os apoia na tentativa de encontrar um acordo que permita a
reparação dos danos causados pelo facto ilícito e contribua para a
restauração da paz social. O mediador não impõe às partes a
obtenção de um acordo ou o seu conteúdo: aproxima as partes e
facilita a obtenção por elas desse acordo.
A mediação será possível em relação à pequena criminalidade e
quando se trate de crimes em relação aos quais já é, actualmente,
possível aplicar outros mecanismos de «diversão» (mecanismos
alternativos à acusação para julgamento) previstos no Código de
Processo Penal. Exceptuam-se os crimes contra a liberdade ou
autodeterminação sexual, os crimes contra bens jurídicos colectivos
e os casos em que o ofendido seja menor de 16 anos ou em que o
arguido seja pessoa colectiva.
Se a mediação conduzir a um acordo entre o arguido e o ofendido,
o processo não prosseguirá, desde que o acordo seja cumprido. Se a
mediação não conduzir a um acordo ou se, obtido acordo, este não
for cumprido, o processo seguirá os seus termos.
Em Portugal, já existe uma muito bem sucedida experiência de
mediação nos Julgados de Paz actualmente existentes. Cerca de 30%
dos litígios apresentados nos Julgados de Paz resolvem-se por
mediação, dispensando a realização de um julgamento pelo juiz de
paz.
III. O Conselho de Ministros aprovou, ainda, os seguintes
diplomas:
1. Resolução do Conselho de Ministros que adopta as decisões
para a reforma do sistema de Laboratórios de Estado
Esta Resolução aprova um conjunto de decisões de reforma do
sistema dos laboratórios do Estado com base nas recomendações do
grupo internacional de trabalho criado com este propósito e após
uma ampla participação na consulta pública de instituições públicas
e empresas, de parceiros sociais, de Universidades e Laboratórios
Associados e de um grande número de profissionais.
Visa-se, deste modo, uma reforma de fundo que pretende atacar e
resolver problemas repetidamente detectados e os principais
bloqueios ao desenvolvimento deste sector crítico para o progresso
científico e técnico do País e para a eficaz prossecução de
importantes políticas públicas. Esta reforma ainda deverá
contribuir para abrir um período de estabilidade institucional,
cuja necessidade é vital para o bom funcionamento dos
Laboratórios.
Neste contexto, procede-se à progressiva reforma do estatuto
jurídico dos Laboratórios do Estado, à redefinição da identidade,
competências e missões de cada instituição, à criação de consórcios
entre laboratórios, estabelecimentos de ensino superior e outras
entidades, assim como à definição de agrupamentos de laboratórios e
outras formas de abertura e cooperação, designadamente com empresas
e outras entidades.
No seu conjunto, a reorganização da rede dos laboratórios do
Estado conduz à extinção e reestruturação do Instituto Nacional de
Engenharia, Tecnologia e Inovação (INETI), do Instituto Nacional de
Investigação Agrária, das Pescas e do Mar (INIAP), do Laboratório
Nacional de Investigação Veterinária (LNIV), do Instituto de
Genética Médica Jacinto Magalhães (IGM-JM), da Direcção-Geral da
Protecção das Culturas (DGPC) e à criação do Laboratório para os
Recursos Biológicos Nacionais (LRBN) e do Laboratório Nacional de
Energia e Geologia (LNEG). Confere-se ainda ao Instituto de
Medicina Legal (IML) o estatuto de laboratório do Estado
Sublinha-se, como elemento fundamental desta reforma, a criação
de consórcios entre laboratórios, universidades e outras entidades
que permitam a formação de massas críticas eficientes, nas
condições de flexibilidade e adaptabilidade necessárias,
possibilitando a junção de meios humanos e materiais e de
disciplinas diversas para objectivos programáticos de médio
prazo.
Por último, esta Resolução incumbe o Ministro da Ciência,
Tecnologia e Ensino Superior de conduzir e acompanhar, com a
assistência do grupo internacional de trabalho e em articulação com
cada uma das respectivas tutelas sectoriais, este processo de
reforma, designadamente a preparação dos novos estatutos de cada
laboratório, a fixação coordenada das respectivas missões, a
definição das normas de transição e das instâncias de
acompanhamento e avaliação da reforma, assim como a constituição
dos consórcios previstos.
2. Resolução do Conselho de Ministros que cria, na dependência
do Ministro de Estado e da Administração Interna, uma estrutura de
missão com o objectivo de gerir o Programa-Quadro «Solidariedade e
gestão dos fluxos migratórios» e nomeia a respectiva
coordenadora.
Esta estrutura de missão tem como objectivo assegurar a gestão
técnica, administrativa e financeira do conjunto dos fundos,
criados pela Comissão Europeia, no âmbito da rubrica «Cidadania,
liberdade, segurança e justiça», que integram o programa-quadro
«Solidariedade e gestão de fluxos migratórios» para o período de
2007 a 2013, destinados ao financiamento de acções nas áreas do
controlo de fronteiras, integração e regresso de imigrantes e
acolhimento de refugiados.
Pretende-se, assim, criar uma estrutura de missão única e
autónoma que vise o pleno cumprimento das obrigações decorrentes da
regulamentação europeia em matéria de gestão de fundos
comunitárias, numa lógica centralizada que permita, por um lado, a
racionalização dos recursos disponíveis e, por outro lado, a gestão
integrada e eficaz dos diversos fundos e das sinergias entre estes,
garantindo transparência, coerência e complementaridade. Neste
sentido, a estrutura de missão passa, também, a assegurar a gestão
do Fundo Europeu para os Refugiados, que já existia anteriormente
ao programa-quadro.
A Resolução estabelece que a estrutura de missão fica na
dependência do Ministro de Estado e da Administração Interna que,
para efeitos da gestão do Fundo Europeu para a Integração, será
conjunta com o Ministro da Presidência.
A Resolução nomeia, desde logo, a licenciada Maria Gabriela
Certã Ventura encarregada de missão, a quem compete, enquanto
autoridade nacional responsável para efeitos dos normativos
comunitários aplicáveis, a gestão do Programa e a coordenação da
estrutura de missão. É também fixado o número máximo de elementos
que a estrutura de missão terá e que assegurarão a gestão dos
quatro fundos do programa-quadro.
Os encargos orçamentais são suportados pelas verbas previstas
nos fundos para assistência técnica e a comparticipação nacional
será assegurada por dotações do Ministério da Administração
Interna.
3. Decreto-Lei que, no uso da autorização legislativa concedida
pela Lei n.º 35/2006, de 2 de Agosto, transpõe para a ordem
jurídica nacional a Directiva n.º 2004/25/CE, do Parlamento Europeu
e do Conselho, de 21 de Abril de 2004, relativa às ofertas públicas
de aquisição
Este Decreto-Lei, aprovado no uso da autorização legislativa
concedida pela Assembleia da República, visa altera o Código dos
Valores Mobiliários, de modo a permitir a transposição de uma
directiva comunitária relativa às ofertas públicas de aquisição
(OPA).
Com este diploma visa-se a harmonização do regime das Ofertas
Públicas de Aquisição (OPA) nos Estados-membros da União Europeia,
respeitando os princípios gerais de equidade de tratamento,
transparência na informação prestada e protecção dos interesses dos
accionistas minoritários e dos trabalhadores das entidades
oferentes e visadas.
Assim, são alterados e aperfeiçoados muitos aspectos do regime
jurídico das OPA, designadamente:
- O dever de lançamento de uma oferta pública de aquisição surge
assim que uma entidade, ou grupo de entidades actuando em
concertação, detenham valores mobiliários da entidade visada em tal
percentagem dos direitos de voto que lhes permitam, directa ou
indirectamente, dispor do controlo da visada, ou seja um terço ou
metade dos direitos de voto;
- Introduz-se uma alteração no cálculo de imputação dos direitos
de voto com relevância para a determinação dos limiares de
controlo. A noção de exercício concertado de direitos de voto é
densificada;
- O lançamento de uma oferta pública de aquisição presume que a
contrapartida oferecida seja equitativa, tanto no seu valor como na
sua forma. Quanto ao primeiro aspecto, consagra-se que a
contrapartida pode ser determinada por auditor independente em
determinadas circunstâncias. Quanto à forma da contrapartida,
estabelece-se que ela pode consistir apenas em valores mobiliários
líquidos, excepto se o oferente tiver adquirido acções da visada,
caso em que é obrigatória uma alternativa em numerário;
- Relativamente ao regime das ofertas concorrentes e a revisão
de ofertas, opta-se por um mercado de controlo competitivo,
sublinhando-se a redução do limite de revisão de contrapartida e a
possibilidade de qualquer oferente rever os termos da oferta;
- No que diz respeito à transparência e aos deveres de
informação, prevê-se que a decisão de lançamento de uma oferta seja
imediatamente tornada pública, com especiais deveres de informação
aos trabalhadores das entidades oferente e visada, incluindo
descrição dos objectivos quanto à manutenção de emprego, ou
localização da actividade em caso de sucesso da oferta;
- No que respeita ao regime sancionatório, são criados novos
tipos de ilícitos susceptíveis de contra-ordenação, destacando-se
pela sua severidade a violação dos deveres de informação;
- É também alterado o regime jurídico da concorrência no sentido
da redução dos prazos de análise pela Autoridade da Concorrência
nas situações em que as ofertas públicas de aquisição sejam
sujeitas a apreciação por essa autoridade, procurando-se, deste
modo, minimizar o período durante o qual a administração da visada
vê os seus poderes limitados.
Por fim, é importante sublinhar que este diploma não se aplica
às OPA cujo anúncio preliminar tenha sido tornado público em data
anterior à sua entrada em vigor, nem às ofertas concorrentes
daquelas.
4. Decreto-Lei que estabelece o regime jurídico de protecção
social da eventualidade de desemprego dos trabalhadores por conta
de outrem e revoga os Decretos-Leis n.º 119/99, de 14 de Abril e
n.º 84/2003, de 24 de Abril
Este Decreto-Lei visa o reforço e a sustentação da protecção
social e a garantia de novas oportunidades de qualificação e
inserção profissional dos beneficiários, adequando o sistema de
protecção social na eventualidade de desemprego ao actual contexto
económico e social.
Deste modo, é reforçado o compromisso da activação e inserção
profissional dos beneficiários das prestações de desemprego, que
passam a estar sujeitos ao cumprimento do plano pessoal de emprego
e aos deveres de procura activa de emprego e de apresentação
quinzenal durante o período de concessão das prestações.
Fixam-se critérios de maior rigor e precisão na caracterização
da involuntariedade do desemprego para reconhecimento do direito à
protecção, atribui-se uma maior relevância aos períodos com registo
de remunerações, que passam a constituir, a par com a idade, um
elemento de consideração no período de duração das prestações de
desemprego.
Introduz-se um novo conceito de emprego conveniente que permite
qualificar com maior rigor e precisão as ofertas de emprego que o
beneficiário não pode recusar sob pena de cessação das prestações
de desemprego. Neste âmbito, são ajustadas as regras por forma a
ter em conta especificidades decorrentes das estruturas familiares,
nomeadamente no que concerne à conciliação da vida familiar com a
vida profissional, diferenciando-se positivamente as condições de
qualificação das ofertas de emprego conveniente para os
beneficiários que tenham menores e dependentes a cargo.
Alteram-se as regras de cálculo do período de concessão das
prestações, que passam a ser calculadas em função da idade do
beneficiário e da carreira contributiva verificada desde a última
situação de desemprego.
Adequa-se o regime de acesso à pensão antecipada a princípios de
promoção do envelhecimento activo, introduzem-se mecanismos de
maior controlo e combate à fraude e concessão indevida de
prestações, prevendo, simultaneamente, um regime sancionatório mais
gravoso.
Por último, consagra-se, no âmbito procedimental, um regime mais
facilitador e flexível no contacto do beneficiário com os serviços,
reduzindo deslocações e permitindo a utilização de meios
electrónicos nos contactos necessários.
5. Decreto-Lei que estabelece o regime jurídico da concessão de
dispensa da componente lectiva ao pessoal docente em funções nos
estabelecimentos públicos escolares e da reclassificação e
reconversão profissionais do docente que seja declarado incapaz
para o exercício da actividade docente
Este Decreto-Lei fixa o novo regime legal que enquadra, de forma
sistematizada, os termos em que os docentes podem beneficiar da
concessão da dispensa da componente lectiva do seu trabalho normal
na escola, clarificando e aperfeiçoando as condições de
apresentação à junta médica para certificação da situação clínica
dos docentes, assim como a situação funcional do próprio docente
que usufrua de tal dispensa.
Deste modo, este novo regime modela e aprofunda a aplicação dos
mecanismos de reclassificação ou de reconversão profissional para
diferente carreira e categoria relativamente aos docentes
considerados incapazes para o exercício da sua função mas aptos ao
desempenho de outras, criando condições para a sua reafectação, de
forma célere e eficiente, em contexto funcional compatível com o
pleno aproveitamento das capacidades e qualificações individuais e
as necessidades reais dos serviços. Destes excluem-se, contudo,
aqueles que sejam portadores de doença incapacitante a fixar por
despacho conjunto dos Ministros da Saúde e da Educação.
A par disso, é concebido um processo de reclassificação ou
reconversão profissional que se desenvolve por um período de cerca
de 145 dias - período que se considera razoável à avaliação da
oportunidade e adequação do perfil do docente, tendo presente o
relatório da junta médica, as habilitações literárias e as
qualificações profissionais detidas, assim como o interesse e a
conveniência do serviço de destino.
Esgotada a possibilidade de promover ou mesmo concluir a
reclassificação ou reconversão profissional do docente - seja por
recusa de opção ou de colocação do próprio, por falta de interesse
do serviço da preferência, por falta de aptidão ou aproveitamento
em curso de formação profissional - prevê-se a aplicação opcional
do regime de aposentação por incapacidade, logo que reunidas as
condições mínimas de tempo, ou, em alternativa, o regime das
licenças sem vencimento nas modalidades até 90 dias, por um ano ou
de longa duração previstas na lei geral.
6. Resolução do Conselho de Ministros que ratifica o
estabelecimento de medidas preventivas, pelo prazo de dois anos, na
área a abranger pelo Plano de Pormenor do Escampadinho
«Parkalgar».
O estabelecimento de medidas preventivas, agora ratificado, visa
evitar que a alteração das circunstâncias e as condições de facto
existentes na área que possam limitar a liberdade de planeamento ou
comprometer ou tornar mais onerosa a exequibilidade das regras
referidas no âmbito da elaboração do referido Plano.